Delírios Sobre Comprometimento - Minha Vida Literária
Minha Vida Literária
20

fev
2019

Delírios Sobre Comprometimento

Muito da minha visão sobre relacionamentos é pautado por dois livros biográficos que discutem a questão do compromisso: Comprometida, de Elizabeth Gilbert, e Para Sempre, de Kim e Krickitt Carpenter.

As Inspirações

No primeiro, a autora de Comer, Rezar, Amar narra sua árdua batalha em se reconciliar com a instituição do casamento. Quando se viu namorando um brasileiro, cujas idas aos EUA foram impedidas pela ausência de um visto permanente, Elizabeth percebeu que a solução estaria em se casar — algo que ela jurou para si não fazer novamente, dadas as dificuldades enfrentadas no divórcio com seu primeiro marido. Assim, ela passou a estudar o matrimônio em diferentes culturas para ter uma visão mais abrangente sobre ele. Em Para Sempre, o casal Kim e Krickitt Carpenter narra o início de sua vida conjugal: após dois meses casados, sofreram um acidente de carro que fez com que Krickitt perdesse a memória e se esquecesse de Kim. Ele, ciente do voto feito na união com a esposa, decidiu tentar reconquistá-la, apesar de todas as dificuldades que o trauma acarretou na relação.

Apesar de bastante diferentes, os dois livros trazem a mesma temática: o comprometimento. Mais do que emoções desenfreadas, seria a noção de se comprometer com alguém a responsável por tornar um relacionamento duradouro, uma ideia que eu também passei a compartilhar.

As Crenças

Quando penso em tantos relacionamentos desfeitos, inevitavelmente acabo pensando, também, nos motivos para que eles tenham chegado ao fim. Incompatibilidades? Sim. Expectativas que não foram atendidas? Também. Mas, especialmente, falta de comprometimento.

Será que quando iniciamos um relacionamento realmente nos dispomos a fazer dele algo duradouro? Quantas e quantas vezes não deixamos na mão do desejado amor a responsabilidade por fazer as coisas darem certo? Se há algo que eu passei a acreditar é que amor algum é suficiente para manter uma relação, ainda que ele seja um ingrediente fundamental. Não, para mim, relacionamentos são construídos a base de empenho, de dedicação, algo somente possível quando você se sente comprometido com algo ou alguém.

Assim, é claro que tanto Comprometida quanto Para Sempre se tornaram inspirações para mim. Como me sentir de forma diferente com histórias tão poderosas, com vidas tão exemplares? E se essas leituras foram pilares em minha construção de visão sobre relacionamentos, não foi uma surpresa que eu tenha ficado extremamente abalada com as notícias de que os casais de ambos os livros acabaram se separando.

Imagem: Pixabay

As Reviravoltas e O Questionamento

Gilberth anunciou a separação com o marido em 2016. Após receber a notícia de que sua melhor amiga estava com câncer, ela descobriu que o relacionamento entre as duas ia além da amizade. Assim, elas começaram um relacionamento amoroso, que durou até a morte da companheira de Elizabeth, no início de 2018. No caso dos Carpenter, a notícia foi mais recente: Krickitt pediu o divórcio após Kim tê-la traído.

Encarar essas notícias não foi chocante apenas pelas separações em si, mas porque elas me fizeram questionar minha crença no tal comprometimento que esses casais simbolizavam. Será que tudo o que eles defenderam continua sendo válido, se eles mesmos não cumpriram com o prometido?

Não sou absolutamente ninguém para responder essa pergunta. Mal tenho 30 anos, meu relacionamento mais longo durou cerca de três e, por mais que eu deseje dividir uma vida com alguém, não tenho a menor noção do que o futuro me reserva. Mesmo que eu estivesse em uma situação completamente diferente, que estivesse em meu leito de morte depois de viver por anos um relacionamento bem-sucedido, eu também não estaria apta a responder, porque tudo que eu dissesse seria válido para minha vivência.

A verdade é que cada experiência é única e somente quem passa por ela está apto a avaliá-la. Se permanecer casados fosse fazer dessas pessoas infelizes, em que mundo seria justo eles continuarem juntos em nome do comprometimento?

Novas Ponderações

Apesar do meu choque inicial, o que vejo é que todas as situações exigiram coragem dos envolvidos. Elizabeth Gilbert foi corajosa de encarar seu trauma por casamentos para ser feliz com o namorado e foi igualmente corajosa ao assumir que o relacionamento não era mais o ideal para eles. Kim foi corajoso ao escolher continuar com uma mulher que não tinha mais sentimentos por ele, esquecidos após o acidente; Krickitt foi corajosa ao pedir a separação do marido que a escolheu anos antes, mas que, agora, não a fazia mais feliz

Então minha crença no comprometimento foi por água abaixo?

Na verdade, não, e estou sendo sincera quando digo que continuo acreditando no que acreditava antes: relacionamentos exigem dedicação e comprometimento de ambas as partes. Porém, cada vez mais tenho me atentado a outro elemento tão importante quanto eles.

Para se comprometer com qualquer coisa é necessário, primeiro, ser extremamente sincero consigo próprio. É isso o que quero para mim? É isso o que faz sentido na minha vida? são perguntas fundamentais antes de se seguir em frente em qualquer decisão. Contudo, as respostas para ela podem variar ao longo da vida. Estamos constantemente em transformação e negar que nós e o outro estamos sujeitos às mudanças é estar fadado a se frustrar. As escolhas de Elizabeth e Kim não foram menos verdadeiras anos atrás só porque hoje elas foram diferentes. Eles mudaram e, com essas mudanças, suas atitudes mudaram com eles.

Imagem: Pixabay

Conclusão?

Relacionamentos são uma temática constante do ser-humano e se após milhares de anos ainda não encontramos uma fórmula que faça deles bem-sucedidos é porque talvez simplesmente não exista uma e buscar por ela seja perda de tempo. Porém, eu também acredito que haja atitudes que podem minimizar as chances de um relacionamento “dar errado” . Entre aspas, porque também acredito que um relacionamento dura o tempo que deve durar; chegar ao fim não anula tudo que deu certo antes disso acontecer.

A primeira coisa é ser sincero: consigo, com o outro, sobre si, sobre o outro. Depois, é se despir de ilusões. Esperar por alguém que corresponda ao seu ideal é inútil, porque não nascemos para atender as expectativas de ninguém. Enxergar no outro uma busca pelo que se quer é também se impossibilitar de conhecer o outro pelo que ele é e pelo que pode oferecer.

E então o compromisso. Se comprometer é se esforçar para passar pelos altos e baixos que certamente virão, é aprender a ceder sem se anular. Se comprometer é compreender a humanidade em cada um e compreender que perfeição não existe. Se comprometer é lembrar que aventuras passageiras são excitantes porque são pautadas em idealizações. Se comprometer é parar de esperar por algo que não existe e enxergar a realidade que está ao seu lado.

Não posso dizer que esses conselhos são eficazes — como falei, são apenas coisas em que acredito. Contudo, sigo na esperança de um dia poder testá-los. Até lá, eu me comprometo comigo e com o objetivo de ser fiel às minhas próprias escolhas e verdades. Independentemente de quando, eu assumo um compromisso com minha felicidade.





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4 Respostas para "Delírios Sobre Comprometimento"

Débora - 20, fevereiro 2019 às (20:14)

Parabéns pelo texto 👏🏽 Você conseguiu descrever muito bem essa temática dos relacionamentos. Não sabia dessa parte de ambas as histórias, mas é importante acreditarmos que é possível ter um relacionamento estável e saudável. Com certeza a chave disso tudo é a dedicação.

Angela Cunha - 21, fevereiro 2019 às (13:24)

Que espetáculo de reflexão!!!
Acho que no momento onde o amor tem dado espaço a violências, traições, relacionamentos desfeitos, nada mais gostoso que parar e pensar em tudo que pode sim, estar atrapalhando aquele sentimento bom que existia no começo da relação e que talvez com o tempo, tenha esfriado um pouco.
Tudo na nossa vida deve ser pautado em se comprometer. Seja em primeiro lugar conosco mesmos e depois com a outra porte.
Mas é preciso saber também até onde ir sozinho. Pois um relacionamento é feito com duas pessoas, nem mais e nem menos!!!
Adorei!!
Beijo

Anna Mendes - 22, fevereiro 2019 às (09:26)

Oi Aione!
Nossa, amei o post!! <3
Eu li Para Sempre e também assisti ao filme, e amei demais essa história! E fiquei muito chocada ao ler seu post e descobrir que o casal se separou 🙁
Amei as suas reflexões e concordo com elas. Realmente, nenhum relacionamento é fácil. Respeito e comprometimento são essenciais! E criar expectativas em cima de outras pessoas é a pior coisa que podemos fazer por elas e por nós mesmos.
Cada pessoa deve se comprometer consigo mesma primeiro. Com a sua própria felicidade. E amei você ter realçado isso! 🙂
Bjos!

Ana I. J. Mercury - 28, fevereiro 2019 às (21:40)

Lindo e emocionante texto!
Disse tudo, Aione.
Primeiro precisamos mesmo estar dispostos a nos comprometer conosco e depois com os outros.
Mas é muito triste ver uma separação, eu sempre acreditei e quis um casamento para sempre, e é duro ver que hoje os casamentos não duram, mas é isso. Que enquanto dure, sejamos felizes.
bjs

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