Li há pouco tempo Aqui É O Melhor Lugar, livro de Cecelia Ahern que em breve resenharei. Nele, a protagonista é obcecada por buscas, não conseguindo ficar tranquila nas situações em que algo desaparece de sua vida. De forma sensível, a autora trata das perdas que precisamos lidar, e inevitavelmente acabei pensando em minha própria situação. Costumo dizer que a escrita é para mim um processo de cura, então resolvi colocar em palavras as reflexões que me tomaram. E, em uma tentativa de que elas funcionem para mais alguém além de mim, resolvi também compartilhá-las.
O começo de tudo…
Não consigo falar de agora sem falar de antes; jornadas costumam ser continuadas, de forma que passado e presente se interligam. Resumindo, em 2016 vivi um dos piores anos da minha vida, seguido pelo melhor até então, em 2017. No ano passado, me libertei de tantas maneiras diferentes, aprendi tanto sobre mim e, principalmente, descobri meu amor e valor próprios a ponto de atingir uma fase de completo bem-estar.
No auge desse momento, conheci uma pessoa e, a partir disso, vivi também o melhor relacionamento que já tive com alguém. Ao mesmo tempo, foi também o relacionamento mais não convencional, a ponto de me surpreender com minha própria postura: a Aione de antes jamais imaginou que um dia viveria algo do tipo. Talvez, justamente por suas características tão singulares é que a relação foi como foi, com a intensidade e significados que atingiu.
E perceberam que falo dela no passado, não é? Bom, desde que começou, eu sabia que estávamos sujeitos a terminar. Queríamos coisas diferentes, apesar de nossas muitas identificações, e resolvi encarar o melhor que a relação poderia me oferecer enquanto eu fosse capaz de lidar com as diferentes expectativas. E tudo fluiu muito bem, até chegar o momento em que percebi que, dali em diante, eu mais me machucaria do que seria feliz, porque nossas diferenças enfim estavam falando alto.
Não fosse todo o processo de autoaprendizado e autoaceitação que vivi antes, jamais teria chegado a essa conclusão com a clareza que cheguei. E mais do que tudo: não teria sido capaz de escolher o amor por mim ao amor por outra pessoa, como acabei fazendo. Até nosso término foi não convencional: repleto de carinho e respeito mútuos.
“Hello darkness, my old friend…”
Por todos esses fatores, eu tinha plena certeza de que, dado o tempo normal que levamos para lidar com nossos lutos — se é que há um “tempo normal” — eu ficaria tão bem de novo quanto estive antes. E, de fato, nas primeiras semanas após o término eu me senti em paz, apesar de triste, por entender o motivo de minhas escolhas. Porém, com o passar do tempo, o que fui descobrindo foi uma sensação de vazio me tragando com cada vez mais força. E não apenas senti a dor da própria situação, senti também culpa por estar mal após ter vivido um período tão doloroso de superação em 2016.
Então comecei a pensar nesse vazio em mim, em por que meu amor próprio não parece suficiente para alimentá-lo, por que eu sinto precisar de um afeto externo para preenchê-lo. É claro que levei a questão à minha psicóloga e, clichê dos clichês, certamente chegamos a acontecimentos de minha infância — nada grave, mas que tiveram influência em minha constituição — que não me permitiram criar essa base em mim, de forma que, hoje, eu busque tão avidamente preenchê-la. E não a busco apenas em relações amorosas, mas também em amizades ou quaisquer outros tipos de relacionamentos que eu possa vir a desenvolver. Em outra consulta, apenas confirmamos como vivo essa busca incessante: ao me referir a um encontro que havia tido, algo mutuamente casual e que não havia intenção alguma de que fosse mais do que isso, soltei um ato-falho e chamei a situação de “começo”.
Foi essencial ter essa percepção, a de que estou inconscientemente encarando toda e qualquer situação como um começo, aguardando que ela se desenvolva, porque, agir assim, me deixa instantaneamente sujeita a me frustrar. Também, me fez perceber o quanto não encaro as pessoas como pessoas, mas como possibilidades de elas serem o que preciso que sejam para preencherem minhas ausências. E isso é tão, mas tão injusto com elas.
Perguntei para minha terapeuta se seria possível, em algum momento, restabelecer essa minha “parte que falta”. Ela não soube me responder e, com ela, entendi que esse não é o primordial. Sinceramente, não acho que seja possível construir algo que deveria ter sido feito lá atrás. E isso quer dizer que viverei para sempre me sentindo incompleta ou buscando alguém que me preencha?
Não. Porque assumir que há um vazio e entender como ele me afeta me permite, também, repensar como devo lidar com ele e com as relações que me cercam. Talvez, com o tempo, eu descubra que sim, meu amor-próprio seja capaz de alimentar até mesmo esse espaço em mim. Mas, até lá, é urgente que eu enxergue as pessoas como elas são, e não como possíveis peças prontas a me completar. Estando ciente de minhas buscas, estou mais apta a encarar o outro de forma mais justa e assim estabelecer relações também mais justas.
“Fica o gosto, ficam as fotos, fica a memória”… Fica o aprendizado.
Quando meu último relacionamento terminou, não sofri apenas pelo seu fim, agora entendo. Nos meses em que estivemos juntos, ele supriu em mim essa ausência que eu ainda nem sabia que carregava. Então, quando ele se foi, levou o que me nutria e deixou meu vazio exposto: sofri por sua partida e sofri pelo que ela revelou em mim. E, sem saber que eu chorava por duas dores, senti tudo com ainda mais intensidade. Foi injusto com nós dois, afinal, também não é certo que uma pessoa carregue consigo um peso maior do que ela é e do que ela tem a oferecer.
Não foi fácil encarar nenhum desses aspectos, assim como não vai ser fácil mudar meu comportamento em relação ao outro. Mas fico feliz de ter tido essa percepção e me sinto grata por ter a oportunidade de ter alguém como minha terapeuta trabalhando ao meu lado para que eu continue me desenvolvendo — e, por isso, sempre levanto a bandeira de que, quem puder, faça terapia também. Terapia muda vidas!
Disso tudo, acho que a maior conclusão a que consigo chegar é que a busca por nós mesmos talvez seja uma das mais difíceis, mas é também das mais esclarecedoras. Buscar por mim tem feito da minha relação comigo e com o mundo mais sincera, mais justa e mais repleta de respeito. E isso, podem ter certeza, só me dá ainda mais forças para continuar essa jornada eterna por mim mesma.
Embora a jornada por si mesma seja uma via entreita de mão única, e só você será capaz de fazê-la, saiba que você não está sozinha nela. Ao seu redor as pessoas que te amam estão na torcida para que seja uma caminhada gloriosa e que com um ou outro contratempo, você seja feliz apenas em percorre-la. E acho que a consciência disso, do caminhar, da atitude em se conhecer melhor e se fazer feliz sozinha para compartilhar essa felicidade com alguém, já é um vislumbre de que você está no caminho certo.
Mas se me permite uma dica (ou spoiler), a jornada não tem fim, caminhar por ela da melhor forma é o que pode nos permitir ser feliz de verdade.
Tenho um carinho imenso por ti e estou torcendo muito para que seus anseios sejam confirmados.
Bj meu e do André!